João Fatalista (versão blogante - parte II)
João Fatalista começou a difundir-se ao mundo.
Todos os seus textos eram publicados em seis das línguas mais faladas com a colaboração de algumas pupilas tradutoras – uma espécie de abelhas operárias do seu fel – que tinham os nomes num destaque da página, em letras pequeninas e coradas de discretas, parecendo ilhotas à volta da fotografia oceânica de seu mentor.
Em poucos meses, o seu blog tornou-se a referência de pensantes à procura de ideias, a Varanasi de políticos ocidentais, a Jerusalém de ateus, a Las Vegas de religiosos, enfim, a via verde de todo o humano com pavor aos penhascos das estradas da info-exclusão.
Lá, no “A Verdade É Amarga”, deixava todo o seu azedume gotejar com uma lógica resistente a qualquer tsunami filosófico e, cada vez mais amiúde, o seu amargor transmutava-se em veneno letal, numa alquimia ofídia dominada apenas por cérebros raros, hermafroditas, que se masturbam nas próprias ideias para procriar nirvanas mentais, plenos no desdém, absolutos no infinito do seu umbigo.
Com parcimónia mas sem misericórdia, com ou sem justificação, distribuía acres bofetadas em profissionais da argumentação, industriais da política, sindicalistas do clero, comerciantes do ilustre. Com vigor igual. Sem olhar a qual.
[O amargo era o seu único amigo]
Todos os seus textos eram publicados em seis das línguas mais faladas com a colaboração de algumas pupilas tradutoras – uma espécie de abelhas operárias do seu fel – que tinham os nomes num destaque da página, em letras pequeninas e coradas de discretas, parecendo ilhotas à volta da fotografia oceânica de seu mentor.
Em poucos meses, o seu blog tornou-se a referência de pensantes à procura de ideias, a Varanasi de políticos ocidentais, a Jerusalém de ateus, a Las Vegas de religiosos, enfim, a via verde de todo o humano com pavor aos penhascos das estradas da info-exclusão.
Lá, no “A Verdade É Amarga”, deixava todo o seu azedume gotejar com uma lógica resistente a qualquer tsunami filosófico e, cada vez mais amiúde, o seu amargor transmutava-se em veneno letal, numa alquimia ofídia dominada apenas por cérebros raros, hermafroditas, que se masturbam nas próprias ideias para procriar nirvanas mentais, plenos no desdém, absolutos no infinito do seu umbigo.
Com parcimónia mas sem misericórdia, com ou sem justificação, distribuía acres bofetadas em profissionais da argumentação, industriais da política, sindicalistas do clero, comerciantes do ilustre. Com vigor igual. Sem olhar a qual.
[O amargo era o seu único amigo]
João Castello Delmonte Fatalista era lido, era seguido, era temido.
As suas audiências aumentavam ao som minimalista de 10 a 20 cliques por segundo e os opinion makers de renome tremiam com o abrupto frio estatístico que se instalara nas suas paróquias. Outrora ungidos, começaram a sentir-se ovelhas sem rebanho, clérigos sem fiéis, e ainda tinham que ler blasfémias dos poucos que passavam para saudar e investigar o mofo.
“O J.F. já disse isso há dois meses n’ A Verdade é Amarga… Quer o link para o arquivo dele?” ou “Este blog já era, todos sabemos isso, mas acho patético o seu desabafo de querer encerrá-lo para sempre. Deixe de ser fatalista!” — eram exemplos bondosos das parcas esmolas atiradas para o copo da sua presente expiação. Rodada após rodada da saudade de gordos e respeitosos dízimos, a classe dos formadores de opinião acabou por unir-se no cálice do mesmo patrono, bebendo da mesma fé: o alcoolismo sabático e ortodoxo.
O sucesso era estrondoso, a competição desqualificada por já acusar doping, mas não abrandava sequer para degustar dissabores alheios ou contar o número dos que, de uma ou outra forma, tinha afectado para sempre.
Nada o demovia. Primeiros-ministros descobrindo que ‘ex‘ seria o mantra a recitar até ao fim da vida, cardeais confessando simpatia (em certos momentos consagrados à ciberleitura) por personalidades como Tomás de Torquemada ou Usāmah Bin Lādin, feministas jurando que a testosterona foi a primeira hormona criada após o big bang, generais lendo Bakounin no local de trabalho e envergando t-shirts de Gandhi a fumar cannabis, açougueiros ameaçando imolarem-se dentro de uma salada gigantesca de agriões — não o perturbavam, não tropeçavam o seu desígnio.
Passados dois anos, publicava tanto que o Google teve que criar o 'Índice JF', o Dow Jones da blogosfera. Os molhos das suas ideias já batiam em uso a mostarda da McDonald's e o ketchup da Heinz mas, mesmo assim, recrutou mais duas discípulas para darem novos paladares aos seus vinagretes, agora com travos de hindi e mandarim.
Lembrava os meses pelo número de posts e os dias pela quantidade de ataques de pânico nas vidas dos que ousaram prescindir dele e apareciam agora na TV, balbuciando choros, lacrimejando desculpas, assoando súplicas de sossego.
[A azia era a sua única transigência]
“O J.F. já disse isso há dois meses n’ A Verdade é Amarga… Quer o link para o arquivo dele?” ou “Este blog já era, todos sabemos isso, mas acho patético o seu desabafo de querer encerrá-lo para sempre. Deixe de ser fatalista!” — eram exemplos bondosos das parcas esmolas atiradas para o copo da sua presente expiação. Rodada após rodada da saudade de gordos e respeitosos dízimos, a classe dos formadores de opinião acabou por unir-se no cálice do mesmo patrono, bebendo da mesma fé: o alcoolismo sabático e ortodoxo.
O sucesso era estrondoso, a competição desqualificada por já acusar doping, mas não abrandava sequer para degustar dissabores alheios ou contar o número dos que, de uma ou outra forma, tinha afectado para sempre.
Nada o demovia. Primeiros-ministros descobrindo que ‘ex‘ seria o mantra a recitar até ao fim da vida, cardeais confessando simpatia (em certos momentos consagrados à ciberleitura) por personalidades como Tomás de Torquemada ou Usāmah Bin Lādin, feministas jurando que a testosterona foi a primeira hormona criada após o big bang, generais lendo Bakounin no local de trabalho e envergando t-shirts de Gandhi a fumar cannabis, açougueiros ameaçando imolarem-se dentro de uma salada gigantesca de agriões — não o perturbavam, não tropeçavam o seu desígnio.
Passados dois anos, publicava tanto que o Google teve que criar o 'Índice JF', o Dow Jones da blogosfera. Os molhos das suas ideias já batiam em uso a mostarda da McDonald's e o ketchup da Heinz mas, mesmo assim, recrutou mais duas discípulas para darem novos paladares aos seus vinagretes, agora com travos de hindi e mandarim.
Lembrava os meses pelo número de posts e os dias pela quantidade de ataques de pânico nas vidas dos que ousaram prescindir dele e apareciam agora na TV, balbuciando choros, lacrimejando desculpas, assoando súplicas de sossego.
[A azia era a sua única transigência]
continua algures neste ano ou no outro, ao cair de um post.
dias bons para todos.
The Album Leaf - On Your Way